terça-feira, 26 de julho de 2011

Estudantes de Custódia perguntam ao Quinteto Violado

A entrevista que se segue faz parte do resgate de matérias antigas publicadas em jornais (ver rodapé da postagem: ¨Olhem o Grito¨), cujo objetivo principal é a curiosidade, evidentemente também são  excelentes registros. Em um blog como este que trata de relatos de vidas, o marcador deverá funcionar como incentivo a novas criações, como é o caso do texto ¨Nós e Os Violados¨ (ver matéria neste blog), criado a partir desta entrevista. Portanto, as observações feitas pelos integrantes do Quinteto Violado devem ser vistas com os olhos daquele ano de 1979, podendo nem representar o atual pensamento do grupo.

A ENTREVISTA

Pergunta: Em qual região do nosso país a música brasileira tem mais aceitação?

Marcelo: Realmente o Sul vive mais para música pela disponibilidade de espetáculos de música brasileira e também pela proximidade dos artistas.

Pergunta: A invasão da música estrangeira não dificulta um pouco?

Marcelo: Existe a invasão, mais a invasão no rádio vamos dizer. Discoteca, digamos, é um movimento que passa. Não chega a prejudicar. A gente sabe que passa como passou Holiday e outros. Ai você ver os rádios só tocando música estrangeira, estão dentro de uma cadeia de mecanismo políticos e econômicos que vivem da venda de uma série de produtos. No país de origem a música estrangeira já foi paga e aqui se incorpora a uma indústria. Mas isso acontece também no cinema, na literatura, etc.

Pergunta: Como é vista a nossa música no exterior?

Marcelo/Toinho: A música brasileira no exterior ainda é um elemento novo, não chega a ser totalmente desconhecida, porque os meios de comunicação estão muito desenvolvidos. Mas como difusão, como aceitação, como adaptação de um público no exterior para a música nordestina, isto não existe ainda, muito embora a música nordestina por ter uma riqueza de influências muito forte, desperta curiosidade pelas informações culturais de uma região. Os músicos que saem do Brasil levam influência nordestina e a gente já encontra um sabor nordestino em tratamentos musicais de outros músicos estrangeiros. No mês passado estivemos na Europa participando de um festival em Berlim, tocando exclusivamente a música Nordestina, dentro de um festival de cultura internacional onde a música regional, a mais primitiva de cada região, era o forte do festival. Esse festival concentrou-se fundamentalmente na África Negra. Lá estava o Brasil, era o único convidado não Africano, eles têm conhecimento da influência africana na nossa música.

Pergunta: Como os amigos viram o Pajeú como fonte de folclore? Qualquer que seja a resposta, o Moxotó não seria também uma contribuição positiva a esse valioso trabalho do Quinteto Violado?

Marcelo/Toinho: Trabalhamos da seguinte forma: retratando aquilo que já tinha sido sucesso através de compositores ou interpretes da região e ai tem uma infinidade de obras e autores, encabeçados por Luiz Gonzaga, Humberto Teixeira, Zé Dantas e Zé Marculino. Ou seja, é um tratamento atual, um tratamento instrumental mais contemporâneo, e aí alcançamos aquele público que originou todo o material que também identificou o nosso trabalho. Um outro tratamento é pegar o material já bonito pela sua naturalidade, pelo seu primitivismo, como são cantorias de reisados, Bumba meu boi, temas de Maracatu, Cirandas, já são coisas prontas e com pouca coisa se faz uma adaptação e mostramos quase na integra. A variedade é muito grande, o quinteto vem trabalhando esse material há oito anos. O Moxotó não se exclui, o Pajeú não se exclui. Nós temos uma pessoa aqui de Afogados da Ingazeira muito amigo nosso, o cantador de viola Raimundo Borges, forneceu um material incrível e hoje vamos utilizar. Portanto, é algo que também gostaríamos de ter da região de vocês, é só uma questão de mostrar ou enviar gravado pra gente.

Pergunta: O trabalho do Quinteto Violado já sofreu alguma censura?

Marcelo: Na realidade nunca tivemos problemas com a censura, apesar de que a música da gente não deixa de ser política. Inclusive até conseguimos trabalhos junto ao próprio governo. O que a gente canta é uma realidade tão grande que é impossível negar. Porém se determinadas músicas fossem cantadas por Chico Buarque com certeza seriam cortadas.

Pergunta: Qual a impressão colhida na missa do vaqueiro?

Marcelo/Toinho: A missa do vaqueiro pra nós representa um documento cultural da região, graças a um líder maravilhoso, um cara simples, um homem do povo, um misturado com os vaqueiros, um derrubador de gado que é o Padre João Câncio, mantendo aquela estrutura e segurando uma barra incrível. Aquela missa é envolvida de aspectos turísticos e culturais, específicos daquele povo, daquela região. E aí vem muita gente de fora para conhecer um pouco o comportamento o povo da região, as coisas que existem, a música, as brincadeiras e as vaquejadas. Agora tem que ser bem dosado para que não interfira no sentido principal deste encontro que é a missa do Vaqueiro, pois tem toda uma historia por trás que acredito que vocês conhecem, a historia de Raimundo Jacó. Esse encontro reúne poetas, cantadores, aboiadores, a própria figura do Vaqueiro, o homem no seu comportamento de trabalho, no seu dia a dia, seu traje, seus atos, costumes que ali se apresentam e a gente aproveitou, procurou dar uma dimensão e mostrar ao mundo aquela comunidade com a sua forma de vida. Fizemos um disco criado pelo poeta Janduir Filizola, que é um homem sertanejo, um cara que anda no sentido contrário do mar. Ele consegue dizer com palavras simples e bonitas toda uma ambientação, todo um aspecto cultural de comportamento deste povo e serve como porta voz poético de toda essa realidade. Nós tratamos o trabalho dele que foi feito especialmente para essa missa e resultou um disco que foi lançado na Europa e em outros países. Da Argentina recebi uma revista falando do comportamento deste trabalho que o Quinteto tinha feito com esse material musical. Na Alemanha foi escrito um livro e um capítulo foi sobre a Missa do Vaqueiro. Isto é, vem aqui, descobre e faz um trabalho para que o seu país tenha conhecimento desta realidade, que mostra o problema da violência, o porquê desta violência, o coronelismo, a posse de terra, o latifúndio, a submissão que vive o homem dentro da terra que não é dele, a necessidade de uma assimilação pela sociedade daquele homem vaqueiro que é para região o que é um operário dentro de São Paulo. Tudo isso tem sua importância e precisa que seja mostrado, seja conhecida pelos estudiosos e isso faz a historia de uma região ou de uma nação.

Pergunta: Amigos deis-mos notícias de Sando?

Marcelo: O Sando vem de uma família tradicionalmente que faz música clássica, são todos concertistas. A vontade do pai é que siga essa linha. Inclusive ele foi para São Paulo participar de um concurso de jovens instrumentistas, em Piracicaba. Ganhou três prêmios, três primeiros lugares.

Pergunta: Quem teve a idéia de fundar o Quinteto Violado?

Toinho: O Quinteto surgiu exatamente da idéia minha com o Marcelo. A gente já era amigos, Marcelo tinha saído do país desde que fez agronomia e foi fazer congregação na Europa. Eu fiquei aqui, terminei Química e comecei a trabalhar como gerente de uma fábrica. Marcelo estava voltando para o Brasil pra assumir uma cadeira na Universidade e eu o levei para conhecer fazenda Nova. E aí, resolvemos montar um espetáculo para fazenda Nova que foi apresentado em outubro de 1971. Houve uma aceitação muito grande e o trabalho foi crescendo chegando ao ponto que tivemos que optar, ou fazia a profissão normal ou fazia música. Criamos uma estrutura para ficar morando no Nordeste que era importante para nós. Com relação à origem, o Quinteto começou comigo (Toinho), Marcelo, Luciano baterista, Fernando Filizola que é violeiro e Sando na flauta. Depois tivemos a saída do Sando e veio Zé da Flauta. Ele se animou e montou um Estúdio de gravação em Recife. Agora tem um outro Luciano. Eu sou de Garanhuns, Marcelo é de Campina Grande, Luciano baterista é de Limoeiro, Fernando do Recife, mas foi criado em Limoeiro. Já Luciano, atual flautista é de Garanhuns e é meu sobrinho.

Entrevista concedida ao jornal ¨O Grito¨, em setembro de 1979.
Redação:

Carlos Lopes, Marleide Espíndola, Maria de Fátima Ferreira, José assis e José Eugênio.
Fizeram a entrevista:
Carlos Lopes, Fernando José, Antônio Remígio e Peter Peterson.

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