quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Olha o Grito - Texto: Peter Peterson

A farmácia de Seu ¨Ontonho¨ estava repleta de habitués. Alí, além de desportistas, estava o Dr. Renato, digníssimo juiz de direito da comarca.  Foi chegando um cliente da farmácia, o Bertino, velho matuto de muita cara feia. Deu boa noite a todos e falou:
- ¨Ô Seu Ontonho, tem xarope de tulu?
- ¨Tem!¨
-  ¨Traga um vidro.¨
Enquanto o velho farmacêutico foi buscar o tal xarope, Dr. Renato – que mesmo sendo um magistrado, gostava de atuar como policial, tal como prender gente, desarmar, etc – observou que Bertino tinha na cintura uma peixeira.  O juiz não titubeou, indo ao encontro do pacato matuto, dizendo:
- ¨Você está armado? ¨
E sem esperar a resposta, arrancou a 12 polegadas do Bertino, quase partindo-lhe o cinto.
Sem esquentar a cabeça, Bertino disse:
-  ¨Embrue o xarope Seu Ontonho. Taqui os onze mi réis.¨
 Recebeu o xarope, virou-se para o Dr. Renato e, na maior ingenuidade deste mundo, disparou a pergunta:
-  ¨O Seu Zé, si má pergunto, cum quem tô falando?¨
 -¨ Com o juiz de direito da comarca!¨
Bertino, que nunca foi de levar ¨mangação¨ para casa, com toda indignação explodiu para não implodir. De chofre, do mesmo modo, arrancou a peixeira da mão do Dr. Renato, botou-a em sua cintura e disse para quem quizesse ouvir, alto e bom som:
- ¨Pensei qui era um sordadi, ora tá bom basta!¨
É amigos, parece que essa função de desarmar os Bertinos não é para juiz de direito – é para ¨sordadi¨, mesmo.

Ps. Texto publicado no Jornal ¨O Grito¨, na página ¨Nossa Terra¨, em setembro de 1979.

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