quinta-feira, 5 de junho de 2014

Texto: 18 (do concurso) - O bode Calibu

A velha  senhora, Dona Leonete, agora vivendo na cidade grande, no outono de sua vida, tinha como alegria permanente,contar histórias de seu tempo de menina para os netos. Uma das historias foi a do seu amor pelo bode Calibu, um belo exemplar caprino, que lhe dera muitos prazeres inocentes. Com os olhos semi cerrados, ela voltava ao passado e se via menina sapeca fazendo artes naquele findão de mundo que era o seu mundo. Assim ela começou, diante de olhos e ouvidos atentos dos netos.
“Até meus nove anos de idade, meus pais e minhas irmãs morávamos em um sítio enorme, no povoado chamado Igarapé-Açu-de Cima, próximo a Vila de Irituia, hoje uma bonita cidadezinha no norte do Pará. No sitio tínhamos árvores frutíferas, patos, galinhas, porco, perus e  pombos. Minha mãe cuidava da casa e das criações e meu pai tinha um pequeno armazém de secos e molhados, único no povoado.Nunca nos faltou alimento, as criações garantiam galinha à cabidela, torresmo, pombos assados, ovos de perua e outras delicias. Tínhamos também um  belo igarapé onde tomávamos banho, lavávamos roupas, louças  e de onde utilizávamos água para beber. Entre as criações havia alguns caprinos, entre os quais o chefe do grupo, o bode Calibu. A companheira de Calibu, garantia o leite diário para a família. Com esse leite meu pai fazia um saboroso mingau de farinha dágua com ovos quebrados dentro. Uma delicia, além de substancioso. Calibu era nosso companheiro de travessuras e quando embrenhávamos pelo mato, ele nos acompanhava, como se fosse nosso guardião.  Nòs tínhamos um amor muito grande por ele e pela família, mas ele era o nosso xodó. Em nossa casa, havia uma espécie de mezanino caboclo onde meu   pai guardava mercadorias e cujo acesso era por uma escada rústica. O nosso amigo Calibu era manso e por casa dessa mansidão, principalmente eu, adorava puxar sua longa barbicha, faze-lo de montaria e segurar-me nos seus chifres enormes.  Durante algum tempo ele suportava os puxões, mas passado o tempo da paciência, ficava furioso, me derrubava  no chão e tentava me atingir com os chifres. O que eu fazia? Subia  para o mezanino caboclo para minha proteção. Calibu ficava no pé da escada espumando  de  raiva, esperando que eu  descesse. E quem disse que eu descia? Só quando ele cansava e ia embora.Pois bem uma  bela manhã, eu estava brincando com minhas bruxas de pano, quando minha irmã mais velha veio  correndo e gritando:
-Mana, vem ver! O Calibu morreu!
-Morreu? Como? Eu não acredito. Morreu de quê?
- Vem ver! Ele tá na beira do igarapé, inchado que nem um balão!
Corremos para lá e vimos o nosso amigo mortinho da silva.     
Ficamos sabendo por nossa mãe, que  Calibu comera mandioca braba deixada por um dos trabalhadores do sitio, por descuido. E mandioca braba é veneno.
Foi choro de não mais acabar. Não podíamos acreditar que nosso amigo morrera. Pedimos ao nosso pai  que fizesse o enterro de Calibu, como se fosse gente. Meu pai atendeu e depois disso, todos os dias íamos na sepultura dele  levar flores e galhos de plantas para deixá-la  enfeitada.
Meu pai ficou muito penalizado não só  por nós, como pela dificuldade de conseguir  outro bode para fazer a cobertura da  viúva caprina, garantir filhotes e o leite para o alimento da família. Tanto procurou que conseguiu outro  animal vindo do nordeste,  para a nossa felicidade em tempos de meninice.  E a historia recomeçou com as nossas atanazações com o nosso novo companheiro que passou a chamar-se de Capitão."
As crianças  ficaram admiradas das traquinices da avó e perguntaram se havia outras parecidas.
-Sim, respondeu a avó. Ma isso fica para  outra noite. Abençoou os netos e foi dormir.

4 comentários:

Jussara Burgos disse...

Excelente texto. Quando você escrever sobre "Capitão" compartilhe conosco, urbanos entediados com o burburinho da cidade grande e escravos dos engarrafamentos. Parabéns

Anônimo disse...

(Padrão usado em todos os textos comentados para dar a todos um tratamento igual). Fazendo pois uso dos critérios apontados no regulamento, deixo aqui minha impressão: ortografia, gramática e pontuação: se há erros graves desta natureza não percebi durante a leitura, mas precisa de pequena revisão. Lembra bastante a estrutura de histórias infantis, diga-se de passagem que escrever bons textos para crianças é sempre um grande desafio, pois está muito além das habilidades apenas narrativas. O texto é simples e parece estar dentro da proposta do concurso (observando o requisito de demonstração de afeto pelo animal). Avaliação pessoal: bom. Parabéns à autora ou ao autor e boa sorte! (Torquato Moreno)

Anônimo disse...

Um texto muito gostoso de ler. Uma simpatia o Calibu. Parabéns! Marina Alves.

Alberto Vasconcelos disse...

Texto muito bom, dentro dos parâmetros do concurso. Os pequenos deslises gramaticais serão facilmente contornados. Parabéns a quem o produziu.